Se isto é um homem
Agora que a fase do reumático me tomou, estando ainda esperançado de que, ao contrário de outras crises, esta seja passageira, dei por mim envolvido na elaboração das mais espalhafatosas teorias à volta desse tema - dores reumáticas ou, mais simplesmente, dores - sem sucesso, porque, até ao momento, não tinha conseguido definir ou pelo menos descrever o que se passava. Tenho duas dores, uma na coluna lombar e outra nas vértebras cervicais. O que é incompreensível é que a dor cervical desaparece sempre que a dor lombar está presente e volta a manifestar-se sempre que a dor lombar desaparece. Não há aqui nada de misterioso para além do facto de não ter conseguido chegar, pelo meu pé ou mesmo ouvindo as mais académicas explicações do médico, a uma formalização válida para este cenário. Aos meus amigos que me convidavam para algumas actividades mais radicais, dizia, “se não fosse a dor cervical”, ou, “se não fosse a dor lombar”, à vez, com grande lata!
Primo Levi, algures no seu espantoso livro “se isto é um homem”, diz-me o seguinte: “Pois a natureza humana é feita de tal forma que os sofrimentos e as dores que acontecem ao mesmo tempo não se somam inteiramente na nossa sensibilidade, mas escondem-se, os menores atrás dos maiores, segundo uma lei prospectiva definida”.
Ora, assim sem querer ou fazer muito por isso, estou a aprender neste capítulo duas grandes verdades, por um lado o meu “reumatismo” (ou o que lhe quisermos chamar) manifesta-se em duas zonas, cervical e lombar, não à vez como a sensação o fazia crer, mas em simultâneo, sendo a dor maior que encobre a dor menor aparentando sincronia, por outro, e este é o maior dos ensinamentos, nenhuma destas dores é suficientemente forte, ou suficientemente dor, para me fazer capaz de formalizar tão “cientificamente” o caso.
Primo Levi continua, um pouco mais à frente, “Por isso, logo que o frio, que durante todo o inverno nos parecera o único inimigo, cessou, apercebemo-nos de que tínhamos fome: e, repetindo o mesmo erro, assim hoje dizemos: «Se não fosse a fome!...»”.
Primo Levi, algures no seu espantoso livro “se isto é um homem”, diz-me o seguinte: “Pois a natureza humana é feita de tal forma que os sofrimentos e as dores que acontecem ao mesmo tempo não se somam inteiramente na nossa sensibilidade, mas escondem-se, os menores atrás dos maiores, segundo uma lei prospectiva definida”.
Ora, assim sem querer ou fazer muito por isso, estou a aprender neste capítulo duas grandes verdades, por um lado o meu “reumatismo” (ou o que lhe quisermos chamar) manifesta-se em duas zonas, cervical e lombar, não à vez como a sensação o fazia crer, mas em simultâneo, sendo a dor maior que encobre a dor menor aparentando sincronia, por outro, e este é o maior dos ensinamentos, nenhuma destas dores é suficientemente forte, ou suficientemente dor, para me fazer capaz de formalizar tão “cientificamente” o caso.
Primo Levi continua, um pouco mais à frente, “Por isso, logo que o frio, que durante todo o inverno nos parecera o único inimigo, cessou, apercebemo-nos de que tínhamos fome: e, repetindo o mesmo erro, assim hoje dizemos: «Se não fosse a fome!...»”.
Da próxima vez irei ao meu médico com este livro debaixo do braço ou, melhor, cancelarei a consulta. O que é uma dorzinha quando comparada com as dores físicas e psicológicas descritas neste livro. A minha passará com um anti-inflamatório. A deles ficará viva no inconsciente para a vida.
Grande livro este sobre os campos de extermínio nazis.
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